GEÓGRAFO ASSOCIA FIM DA PRAÇA DOS ESTUDANTES PARA CONSTRUÇÃO DE DELEGACIA A TRAÇOS DE SUBDESENVOLVIMENTO


Em novo artigo enviado à redação NEXUS-OBJETIVO nesta segunda-feira (24), o geógrafo e professor universitário Sebastião P.G. de Cerqueira-Neto tece considerações a respeito do  conceito de subdesenvolvimento e ressalta: "um Estado que privilegia a construção de órgãos de segurança e, ao mesmo tempo, desampara suas escolas, deve ter um conceito equivocado sobre o que seja desenvolvimento”.


O subdesenvolvimento

                                                                                    Sebastião P.G. de Cerqueira-Neto

Não existe um conceito universal do significado da palavra desenvolvimento; este termo é motivo de conversa nos diversos setores da sociedade. Qualquer pessoa tem uma definição do que seja o desenvolvimento, tanto no âmbito da coletividade como da individualidade. Mas a proposta deste texto é falar sobre o subdesenvolvimento, que é muito mais presente no cotidiano de nossas cidades, do que o desenvolvimento.

Para tomar como referências teóricas, podemos dizer que o subdesenvolvimento se dá nos lugares opacos, estudados amplamente por Milton Santos; ou também pode estar presente no sul metafórico de Boaventura de Sousa Santos. Tanto num autor como no outro, os estudos são sobre os pobres.

Nos lugares opacos ou no sul metafórico é onde se encontram políticos sem uma identificação ideológica e desvinculados com a percepção e anseios da população; é onde o Estado, deliberadamente, não se compromete com a educação, deixando escolas se tornarem ruínas urbanas; é onde o pobre se torna abstrato; é onde políticos traem o povo e renegam sua origem; é onde a falta de cultura para o debate impera.

Mas, paradoxalmente, é no sul, nos lugares opacos, onde também podemos encontrar os que estão ao lado do povo, como políticos que não vivam sob o limite do maniqueísmo e que procuram outros caminhos; de intelectuais que formulam análises onde o povo esteja no centro dos debates, e que, por conseguinte, causam o desconforto.

Essa postura de indignação é a mola propulsora de outra perspectiva de análise para o território. Mas, é provável que a busca pela superação desse estágio de conformismo poderá gerar múltiplos desconfortos tanto no meio acadêmico quanto no meio político e talvez em alguns setores da sociedade.

Mas, como diria Milton Santos “o intelectual existe para causar o desconforto”. São as abstrações e as metáforas, como a indignação, a injustiça, a religiosidade, a conscientização, os homens pobres, os lugares opacos, o lado invisível, linha abissal, encontrados em Boaventura de Sousa Santos e em Milton Santos, que possuem uma enorme capacidade de provocar grandes transformações concretas no território, quando afloradas pelo inconformismo intelectual, nos gritos dos excluídos ou na combinação de ambos.

Esse ativismo pretende provocar mudanças dentro de um sistema que está petrificado e que não acompanhou, e, ao mesmo tempo, negligenciou as características, dinâmicas e carências da sociedade atual, pois adota metodologias arcaicas, rígidas e excludentes na administração do território e na relação com as sociedades.

É no subdesenvolvimento que ocorrem as transgressões dos mapas impostos por uma cartografia oficial que tenta reprimir a sociedade; daí movimentos como as Manifestações de 2013 no Brasil, Ocuppy Wall Street em 2011, a Primavera Árabe em 2010, e recentemente a marcha forçada do povo sírio em direção à Europa, o abraço que os cristãos deram na Praça dos Estudantes, em Nanuque, são exemplos de que vivemos numa profunda crise entre as cartografias oficiais e um mundo sem fronteiras requisitado por indignados que não desejam mais habitar lugares opacos.

Por fim, um Estado que privilegia a construção de órgãos de segurança e, ao mesmo tempo, desampara suas escolas, deve ter um conceito equivocado sobre o que seja desenvolvimento; ainda que este conceito não se tenha uma única definição. Certamente que esta reflexão não cabe ao Brasil, mas para a Suíça, Dinamarca, Finlândia, Noruega, Luxemburgo, Suécia...

Sebastião P.G. de Cerqueira-Neto
Professor no Instituto Federal da Bahia
Professor no Mestrado em Ciências e Tecnologias Ambientais IFBA/UFSB
Pós doutorado na UFBA
Pós doutorado na Universidade de Coimbra-Portugal
Pós doutorando na UFRJ
Acima de tudo, um Nanuquense

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