ATRIZ QUE TEVE VIRGINDADE LEILOADA EM NANUQUE QUANDO TINHA 14 ANOS ESTÁ DE VOLTA AO CINEMA E VAI LANÇAR LIVRO


Fugindo do pai alcoólatra e do tio pedófilo, Jussara Calmon saiu de Colatina, no Espírito Santo, e foi parar numa espécie de bordel em Nanuque, onde teve sua virgindade leiloada, aos 14 anos, para um coronel da região. Antes, já tinha trabalhado num matadouro e pedido esmola nas ruas.

JUSSARA CALMON
Estas são algumas das muitas histórias de vida da atriz que se transformou em um dos corpos mais desejados no cinema do início dos anos 80 após participar de sucessos de bilheteria como “Coisas Eróticas”, “Rio Babilônia” e “Longa Noite de Prazer” – longa-metragem que entrou em exibição em vários cinemas das capitais.

Prestes a completar 60 anos, a musa da pornochanchada brasileira tem participado de algumas sessões para comentar o filme de Afrânio Vital e também falar de vários episódios de uma trajetória que misturou doses de drama e certo humor, como a imagem de um Robert De Niro saindo de toalha do armário de seu quarto de hotel.


Grande amor: NANUQUE EM SUA VIDA

“Era para estar hoje me prostituindo, na Cracolândia. Mas estou aqui”, salienta Jussara, recém-chegada da Noruega, onde foi, enfim, “desfrutar o amor de sua vida”. Quando o dono do bordel de Nanuque vendeu a virgindade dela, a garota capixaba também estava à espera, ingenuamente, dessa história romântica.

“Era novinha, só queria encontrar meu grande amor. Tinha flertado com ele naquela tarde e o dono da boate havia me dito para eu esperar no quarto, de banho tomado. Aí resolvi botar talco e fiquei toda branca. Quando o coronel chegou, ele levou um susto, talvez por lembrá-lo que ele estava na cama com uma menor de idade”, lembra.

Mais uma vez com os pés na estrada, ela foi em direção ao Rio de Janeiro ao lado de uma amiga, à espera de realizar o seu sonho de virar artista. Flerte que teve início ainda criança, quando foi criada num circo, vendo a mãe trapezista pendurada numa barra. Sua chegada à Cidade Maravilhosa coincidiu com o auge da pornochanchada.

Sexo explícito

CARTAZ DO FILME - 1982
NA ÉPOCA, GRANDE SUCESSO NOS
CINEMAS DE NANUQUE, COMO
CINE ORION E BRALANDA
Seu primeiro filme foi justamente “Coisas Eróticas”, lançado em 1982 e famoso por se tornar a primeira produção nacional com sexo explícito. “Fiz as cenas e não me arrependo. Não fico remoendo o que aconteceu. Não verdade, não fiz tudo, pois o ator ficou apaixonado por uma menininha, que fazia a minha filha na história. Ele dizia que só conseguia com ela”, registra.

Anos depois, Calmon conta que, recebeu proposta para participar de um filme da chancela pornô “Brasileirinhas”, que elencou várias atrizes conhecidas, como Gretchen, Rita Cadillac e Leila Lopes. “Ofereceram muito dinheiro, mas não quis. Fiz ‘Coisas Eróticas’ porque surgiu naquele momento. Acabou ali”, assinala.

Filme de Afrânio Vital é um ‘erótico com conteúdo’


O marido de Jussara, o norueguês Gudmund Fjortoft, tem acompanhado a atriz nas exibições. “Já falei para ele não se assustar, pois tem muita putaria”, diz. Mas garante que o amor atual tem ciência de seu currículo. “Claro que ele sabe o que eu fiz. Na Noruega, fizeram uma reportagem comigo sobre o livro que lancei”.

Lançado em 2012, o livro “Jussara Calmon, Muito Prazer” foi escrito por Fábio Fabrício Fabretti e revela vários detalhes da carreira da atriz. Entre eles, o episódio com Robert De Niro, que veio ao Brasil para divulgar um filme. Após vê-la num baile de Carnaval, no Rio, o Camaleão americano não parou um dia sequer de procurá-la. “Assessores dele deixaram mais de 100 recados em minha secretária eletrônica, mas não queria encontrá-lo. Naquela época ainda não tinham essas meninas novas quererem se relacionar com nome famoso. Mas o (sambista e ator) Haroldo Costa , que era meu amigo, insistiu para eu ir. Ficamos duas noites juntos e depois ele foi embora”, lembra.

 “O engraçado do encontro com De Niro foi que, ao chegar ao quarto dele, um assessor abriu a porta e ele saiu do armário, envolvido numa toalha”, recorda a atriz de 59 anos


No livro, Jussara dedica um carinho especial a Afrânio Vital, diretor de “Longa Noite de Prazer”. Dos bastidores, ela lembra que o cineasta a fez ler Augusto dos Anjos, poeta simbolista que ela desconhecia na época. “Aprendi a ler com o Afrânio, que é uma pessoa culta. O filme, apesar de ser uma pornochanchada, é um reflexo disso. É um erótico com conteúdo”. Na trama, dois amigos, um branco, o outro negro, vivem de pequenos furtos e acabam encontrando duas mulheres que irão modificar suas vidas.

FILME DERRUBOU BARREIRAS

Há 35 anos, "Coisas Eróticas"  driblava a censura militar e chegava ao cinema. Foi o primeiro pornô rodado no Brasil. O longa-metragem, de Rafael Rossi, foi além das pornochanchadas: tinha cenas de sexo explícito, lesbianismo e de cara limpa. 

ANÚNCIO DO FILME EM JORNAIS DA ÉPOCA
Em 1982, o Brasil vivia a abertura política, mas mesmo assim a censura nas artes continuava. Toda a produção cinematográfica tinha que passar pelo crivo da Divisão de Censura de Diversões Públicas e receber o selo de aprovação. Por um deslize da censura, somada a esperteza do diretor   Raffaele Rossi, um italiano radicado em São Paulo, o filme passou.  Em fevereiro de 1982, Rossi recebeu um documento vindo de Brasília sobre seu filme. Nele, os censores ordenavam que o longa-metragem, dividido em três histórias, tivesse o seu "segundo quadro" cortado por inteiro. Eles se referiam à segunda história toda, a mais tórrida, que continha palavrões, sadomasoquismo, homossexualismo e sexo grupal. Só que o diretor se fez de bobo. Tomou o termo "quadro", como quadro mesmo, ou seja um fotograma (cada impressão fotográfica, algo aquém de 1 segundo).
 
Com essa diminuta alteração, "Coisas Eróticas" foi reenviada à DCPD, que liberou sua veiculação comercial. Foi um estrondo de sucesso em todo país. Em quase três anos de exibição, o filme foi visto por mais de 4,7 milhões de espectadores, público superior ao de "Carandiru", "Cidade de Deus" e "Se eu fosse você". Trata-se da 13ª maior bilheteria do país, segundo dados  de 2011 da Agência Nacional de Cinema (Ancine).

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